Empregada dispensada depois de depor na polícia contra empregador consegue indenização


Um atrito dentro de um supermercado faz com que a polícia seja chamada. Na oportunidade são ouvidas testemunhas, uma delas uma empregada do próprio estabelecimento. Esta relata o que presenciou, sem se preocupar em beneficiar o patrão. Na sequência, é advertida, suspensa e, por fim, dispensada do emprego. Mera coincidência? Para o juiz Márcio Toledo Gonçalves, que julgou a reclamação na 5ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, a resposta é não.

Após analisar o processo, ele não teve dúvidas de que a empregada foi dispensada em retaliação por ter deposto contra os interesses da empresa. Para o julgador, motivo suficiente para gerar o dever de reparar. Por essa razão, o supermercado foi condenado a pagar à trabalhadora uma indenização por dano moral no valor de R$5.920,00.

Na inicial, a reclamante contou que o gerente teria dito que funcionários como ela não serviam para trabalhar na empresa. Segundo relatou, o chefe repudiou o fato de ela ter falado a verdade para a polícia, pois isto prejudicou a empresa. Depois disso, a empregada passou a ser perseguida com punições e acabou sendo dispensada. Em defesa, o supermercado negou essas condutas, afirmando que a reclamante não foi vítima de qualquer ato que causasse dano de ordem moral.

No entanto, o argumento patronal não foi acatado pelo julgador. Discorrendo sobre a dignidade da pessoa humana como fundamento da República e se valendo da legislação que regula a indenização por dano moral, o relator não teve dúvidas de que o supermercado praticou um ato ilícito que impõe o dever de reparação.

Para o juiz sentenciante, os fatos falam por si: "Não é crível que o desdobramento dos fatos não tenha uma ligação de causa e efeito. Afronta qualquer juízo lógico e razoável considerar-se como uma mera coincidência o fato de a autora ter sido punida exatamente no dia em que depôs contra os interesses da reclamada como testemunha em uma ocorrência policial" , destacou.

Declarações de testemunhas também levaram o magistrado a acreditar que a reclamante foi dispensada em perseguição ao testemunho prestado. Uma retaliação, como concluiu na sentença. A conduta empresarial foi classificada de ilegal, desleal, arbitrária, afrontando claramente a dignidade do ser humano. O julgador lembrou que o empregador pode dispensar um empregado (artigo 7º, caput e 10, inciso I, do ADCT, CF/88), mas frisou que esse direito não pode ser exercido de forma abusiva e com má-fé. Ou mesmo de forma discriminatória, como entendeu ser o caso do processo.

Na visão do juiz sentenciante, o patrão não apenas violou garantias e princípios constitucionais com a sua conduta. O réu tentou também intimidar os demais trabalhadores a não agirem da mesma forma. Com isso, violou inclusive o dever de colaboração com a administração pública e a justiça. Por fim, o julgador salientou que em casos como o do processo, bastam indícios para comprovar a ilicitude. Como ensina a boa doutrina e jurisprudência, eles também constituem elementos de convencimento do julgador e, portanto, de prova.

"Vislumbro dano moral sofrido pela autora, na medida em que foi injusta e abusivamente demitida, perdendo seu posto de trabalho, debilitando-se, não há dúvida, pela perspectiva de buscar alocar-se em um novo posto e de tentar apagar a mancha causada por um ato de revanchismo e discriminação praticado contra sua pessoa e por uma entidade dotada de um poderio econômico infinitamente superior, o que em tudo fere a dignidade da pessoa humana do trabalhador e dois dos principais postulados de natureza fundamental que a Constituição de 1988 busca tanto imprimir no seio da comunidade: o da dignidade da pessoa humana e do valor social do trabalho – art. 1º, III e IV" , registrou na sentença, decidindo condenar o supermercado ao pagamento de indenização por dano moral. O réu recorreu, mas o Tribunal de Minas manteve a condenação.

( 0001271-06.2012.5.03.0005 AIRR )

 

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