Um confeiteiro de Goiânia que sofreu acidente ao manipular uma máquina de panificação comprovou na Justiça do Trabalho a responsabilidade civil da padaria em que trabalhava e deverá ser ressarcido pelos danos sofridos. A decisão da Segunda Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (TRT-18) aponta que não havendo dúvidas da ocorrência do acidente de trabalho e estando presentes os elementos caracterizadores da responsabilidade civil, o empregado faz jus à indenização dos danos materiais, morais e também estéticos.
Segundo o Colegiado, o valor da reparação deve ser correspondente à gravidade da ofensa e seguir os demais critérios legais. No caso do confeiteiro, os valores conferidos, considerando o salário do trabalhador registrado em sua carteira de trabalho (CTPS), sua idade e a extensão do dano, ultrapassam os R$200 mil.
Entenda o caso
O funcionário afirma no processo que trabalhava na preparação de pães usando máquina de panificação com cilindro compressor de massas e que manipulava o aparelho sempre sem equipamento de proteção individual (EPI) por falta de material fornecido pela empresa. Também aponta que o instrumento operado por ele, apesar de elétrico, não possuía sensores de segurança em caso de acidente, com dispositivo de parada de emergência,.
Segundo o trabalhador, o equipamento era antigo, com adaptações precárias, sem apresentar segurança adequada para o seu uso. O trabalhador também afirma que, além de não ter os EPIs necessários, não recebeu instrução de como proceder em caso de acidente ou falha do aparelho. No dia do ocorrido, o cilindro da máquina compressora girou em sentido contrário e esmagou sua mão, punho e parte do antebraço esquerdos, sem chance de reação, conforme fotos apresentadas no processo.
Nexo causal
Desde a sentença de primeiro grau, o nexo causal foi reconhecido no acidente sofrido pelo trabalhador. Baseado nas provas e nos laudos periciais apresentados, o juiz da 11ª Vara do Trabalho de Goiânia, Carlos Begalles, destacou que a empresa é responsável pela adoção e uso das medidas coletivas e individuais de proteção e segurança da saúde do trabalhador, devendo cumprir e fazer cumprir as normas de segurança, na forma do art. artigo 157 da CLT. Segundo o magistrado, no caso da padaria ficou caracterizado seu descumprimento, fazendo surgir a obrigação de indenizar pelo prejuízo sofrido.
Recurso
Ambas as partes do processo recorreram ao TRT-18 para reformar a sentença. A empresa, embora não tenha questionado o nexo causal, recorreu do dano moral afirmando que o funcionário não provou em momento algum qualquer abalo emocional pelo acidente e pediu a improcedência do pedido.
A padaria defendeu que os danos comprovados nos autos foram apenas de origem estética e material. Requereu que a condenação por danos estéticos fosse reduzida para R$ 2 mil, para, segundo ela, ser coerente com as condições financeiras da empresa e do confeiteiro. Além disso, solicitou que o pagamento do dano material fosse realizado mensalmente e não em parcela única, como determinado na sentença.
O empregado, por sua vez, recorreu para majorar a indenização por dano moral, entendendo que o valor deveria chegar a 20 vezes o valor de sua remuneração mensal também pediu a majoração da pensão vitalícia para 70% do seu salário.
Analisando os pedidos, o relator do processo, desembargador Platon de Azevedo Filho, registrou que a ofensa à harmonia física do reclamante, além de configurada, é aparente e irreversível. Segundo ele, o perito médico deixou claro que o trabalhador tem sequelas morfológicas importantes, distorção irreversível do padrão anatômico das partes do corpo afetadas e cicatrizes amplas que podem ser demonstradas nas fotografias juntadas aos autos.
Indenização
Avaliando os elementos apontados no processo e os critérios legais, e considerando a dupla finalidade do instituto da indenização – compensatória e pedagógica – o relator elevou o valor fixado a título de danos estéticos para R$ 10 mil. Com relação ao dano moral, entendeu que tanto o recurso da empresa quanto o recurso do confeiteiro não devem prosperar. Manteve o valor arbitrado como compensação pelos danos morais no importe de R$ 20 mil, correspondente a pouco mais de 11 vezes o salário do trabalhador, por entendê-lo adequado, razoável e proporcional à ofensa aos direitos da personalidade da vítima, satisfazendo as suas finalidades compensatória e pedagógica.
Com relação ao pedido de dano material, o juízo de primeiro grau considerou devida pensão vitalícia ao reclamante, no valor de 30% do último salário (R$ 1.800,00) a contar do acidente, ocorrido em agosto de 2019, pela restrição definitiva para realizar atividades profissionais que exijam a motricidade plena dos membros acometidos. Deferiu a aplicação do parágrafo único do art. 950 do Código Civil, arbitrando a indenização devida a título de pensão vitalícia em R$ 140 mil, a ser paga de uma só vez.
Segundo o relator do processo, o juízo de primeiro grau levou em conta a idade do autor quando da ocorrência do acidente (31 anos) e a tábua de mortalidade do IBGE, que forneceu uma expectativa de vida de 74,9 anos para ambos os sexos, restando o tempo de expectativa de vida do funcionário de mais 43 anos. Após os cálculos, o magistrado considerou deságio médio de 50% sobre o valor total para pagamento em parcela única.
Nesse contexto, o desembargador entendeu que o arbitramento da pensão vitalícia devida ao reclamante no valor de 30% do último salário obreiro está em conformidade com o percentual de perda da capacidade laborativa visualizado pelo perito, entretanto, avaliou que o deságio para pagamento em parcela única, levando em conta as provas nos autos, o tempo restante de expectativa de vida do empregado e o princípio da razoabilidade, deverá ser reduzido para 35%.
O desembargador fixou novo valor à condenação, na qual o dano material passou para cerca de R$201 mil, o dano moral foi mantido em R$20 mil e o dano estético arbitrado em R$10 mil. Os demais desembargadores da Segunda Turma votaram com o relator.
Processo 0011187-48.2020.5.18.0011
Jackelyne Alarcão