Por que os Sindicatos estão ressurgindo nos EUA

A decisão de funcionários de um armazém da Amazon em Nova York de participar de um sindicato, anunciada no início do mês, foi recebida não apenas como uma vitória inédita para trabalhadores da empresa, mas também como um evento de significado histórico dentro do movimento trabalhista nos Estados Unidos.

A Amazon, fundada em 1994, é o segundo maior empregador privado do país e resiste à sindicalização de seus funcionários. No passado, mesmo grandes sindicatos com décadas de experiência e milhões de dólares à disposição haviam fracassado em campanhas do tipo em outras unidades da empresa.

Mas, em votação em 1º de abril, funcionários do JFK8, um enorme depósito da Amazon com mais de 8.000 empregados localizado em Staten Island, na cidade de Nova York, aprovaram a sindicalização. Na eleição, 2.654 votaram a favor de serem representados por um sindicato de trabalhadores, e outros 2.131 votaram contra.

Essa iniciativa vitoriosa foi diferente de outros esforços do tipo, que costumam empregar organizadores profissionais. A campanha em Nova York foi encabeçada pelos próprios funcionários do armazém, com recursos limitados, arrecadados por meio de um site de financiamento coletivo.

“É provavelmente a mais importante vitória sindical (no país) em quase cem anos”, diz à BBC News Brasil o professor John Logan, diretor do departamento de estudos sobre Trabalho e Emprego da San Francisco State University, na Califórnia.

O resultado favorável na Amazon ocorre depois de uma série de vitórias semelhantes na rede de cafeterias Starbucks e em outras empresas menores nos Estados Unidos.

Na semana passada, funcionários em seis unidades da Starbucks no Estado de Nova York votaram pela sindicalização, elevando para 16 o número de lojas da rede no país onde iniciativas do tipo foram bem-sucedidas. Trabalhadores e organizadores em pelo menos outras 180 unidades da Starbucks em 29 Estados já entraram com petições com o objetivo de levar adiante a sindicalização.

Essas iniciativas, apesar de relevantes, representam uma ínfima parcela do total de trabalhadores no país. Somente a Starbucks tem mais de 9.000 lojas nos Estados Unidos. O depósito da Amazon em Nova York tem um número grande de empregados, mas ainda assim minúsculo diante da magnitude da empresa, que tem mais de 1,5 milhão de funcionários ao redor do mundo.

Mas, apesar do alcance limitado, muitos esperam que esses sucessos recentes, liderados por uma nova geração de trabalhadores jovens, possam ajudar a revitalizar o movimento trabalhista americano, que vem despertando interesse renovado depois de décadas de declínio.

De acordo com pesquisa Gallup de setembro passado, 68% dos americanos aprovam sindicatos trabalhistas, o maior percentual desde 1965. Entre os entrevistados que se identificam como democratas a aprovação é ainda maior, chegando a 90%.

“Certamente há um grau de otimismo, energia e entusiasmo em algumas partes do movimento trabalhista que não víamos há décadas”, salienta Logan, que é especialista na história dos movimentos trabalhistas dos Estados Unidos.

Mas o professor lembra que esse entusiasmo ainda não está refletido nos números. O percentual de trabalhadores representados por sindicatos vem caindo gradualmente no país desde a década de 1980, quando era em torno de 20%. Segundo o centro de pesquisas Pew Research Center, no ano passado somente 10,3% dos empregados no país pertenciam a um sindicato.

“Será preciso um esforço extraordinário para reverter esse declínio”, destaca Logan. “Se pensarmos em termos de números, [as vitórias recentes] são uma gota no oceano.”

PANDEMIA E MERCADO DE TRABALHO APERTADO

Logan e outros especialistas observam que os resultados recentes foram possíveis graças a uma conjunção de fatores que tornam este um momento peculiar no mercado de trabalho dos Estados Unidos, com alta demanda por funcionários.

Após dois anos de pandemia, muitos trabalhadores estão cansados de receber salários que não acompanham a inflação enquanto grandes empresas registram lucros recordes.

“Dois anos atrás, uma vitória como essa [na Amazon] seria impensável. Mas estamos em um momento diferente, com um cenário trabalhista completamente modificado”, ressalta Logan.

“Depois de trabalhar por dois anos durante a pandemia e sentir que não foram recompensados adequadamente nem tratados com respeito, muitos trabalhadores estão receptivos à mensagem do sindicato, de uma maneira que, dois anos atrás, não se poderia imaginar ser bem-sucedida.”

As vitórias sindicais também ocorrem em um cenário político mais favorável do que o de poucos anos atrás. Joe Biden é considerado o presidente americano mais pró-sindicatos em décadas, e desde que tomou posse, em janeiro de 2021, reverteu leis aprovadas no governo anterior que, segundo críticos, enfraqueciam proteções trabalhistas.

No ano passado, Biden já havia manifestado apoio à tentativa de sindicalizar funcionários em outro depósito da Amazon, no Estado do Alabama, em um esforço que acabou fracassando. Na semana passada, em um evento com líderes trabalhistas em Washington, o presidente citou o resultado na unidade da empresa em Nova York.

“Os sindicatos representam, na minha opinião, dignidade e respeito pelas pessoas que trabalham duro”, afirmou Biden, ao promover uma força-tarefa criada por seu governo “para garantir que a decisão de se unir a um sindicato pertença somente aos trabalhadores”.

“E a propósito, Amazon, aqui vamos nós”, disse Biden, diante de aplausos.

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