Rescisão do contrato de trabalho deve ser clara e transparente

        Na Vara do Trabalho de Sabará, em Minas Gerais, ocorreu uma situação especial em que a juíza Rosemary de Oliveira Pires se viu diante de um impasse e precisou utilizar sua capacidade de análise e experiência como julgadora, a fim de buscar a verdade real do processo. É que, segundo as alegações do reclamante, o preposto da empresa teria fugido com o dinheiro da rescisão e teria dito que o trabalhador não receberia nada. Por sua vez, a empresa tentou convencer a juíza de que a rescisão foi baseada em pedido de demissão do reclamante, o qual, insatisfeito e arrependido, recusou-se a receber os valores devidos, danificou o patrimônio da reclamada e agrediu o preposto, que, por isso, teria fugido do local. O episódio não foi presenciado por ninguém. Diante da fragilidade das provas existentes, restou a palavra do empregado contra a palavra da empregadora. Então, a partir da análise dos indícios, a magistrada descobriu quem estava com a razão e encontrou uma solução para o problema.

        De acordo com a versão apresentada pelo reclamante, a sua intenção inicial era reivindicar a rescisão indireta do contrato de trabalho, em virtude de atraso salarial. Mas, no dia 27/08/2009, ele foi chamado pela empregadora para realizar um acerto amigável, no qual seria dispensado sem justa causa. O reclamante, que trabalhava como ajudante de caminhão, relatou que, após ter assinado todos os documentos referentes ao acordo amigável, o representante da empresa fugiu do local levando o dinheiro do trabalhador e dizendo que ele não receberia nada. A empresa afirmou que o ex-empregado pediu demissão, mas se arrependeu depois que teve ciência dos valores menores que receberia, ficando insatisfeito pelo fato de ter que indenizar o aviso prévio ao empregador, pois não seria trabalhado. Em razão disso, ele desrespeitou o representante da empresa, fazendo-lhe ameaças, e se recusou a receber os valores devidos. Acrescentou a reclamada que o ex-empregado, em acesso de raiva, causou muitos transtornos e prejuízos materiais à empresa e ainda acionou as polícias civil e militar para registrar boletim de ocorrência. Por esses motivos, a empresa aplicou justa causa ao trabalhador.

         Examinando as poucas provas existentes, a juíza estranhou o fato de o termo de rescisão do contrato de trabalho apresentar como data de afastamento o dia 26/08/2009, ou seja, um dia antes da data relatada nos depoimentos de ambas as partes. Por isso, ela considerou o documento inválido. Conforme observou a magistrada, tudo indica que havia interesse do reclamante em sair da empresa, já que ele mesmo afirmou que foi chamado para realizar um acerto amigável, no qual, entretanto, seria dispensado sem justa causa, ou seja, supunha que sua saída não lhe traria prejuízo em suas verbas rescisórias. A partir dessa observação, a magistrada identificou alguns erros no procedimento rescisório realizado pela empresa: se a saída do reclamante era pra ser na modalidade de demissão, a reclamada deveria ter esclarecido melhor a ele sobre os efeitos do pedido de demissão, inclusive em relação à necessidade de cumprimento de aviso prévio trabalhado, se ele quisesse. Portanto, a empresa não poderia impor ao ex-empregado o desconto imediato do valor integral do aviso, tirando dele o direito de trabalhar durante o período.

             Outro detalhe que chamou a atenção da juíza foi o fato de haver empregados trabalhando na empresa no horário em que o acerto estava sendo realizado. "Desta forma, quando a reclamada fez a reunião de acerto com o autor em suas dependências deveria ter melhor se acautelado, seja esclarecendo ao autor as conseqüências da rescisão, seja, ao verificar sua discordância, suspender a rescisão ou, pelo menos, convocar outros empregados para participar como testemunhas do que ali estava ocorrendo para que todo o processo de rescisão ficasse absolutamente claro e transparente com relação à lisura dos atos da reclamada, demonstrando que esta não tinha qualquer intenção de lesar o autor em seus direitos, não se aproveitando da condição de hipossuficiente deste e do inegável desconhecimento e despreparo do obreiro em matéria de direitos trabalhistas, sabido que a empresa possui pelo menos um mínimo de conhecimento contábil e jurídico acerca da matéria" – ponderou a magistrada.

               Assim, concluindo que não ficou comprovada a condição de demissionário do reclamante, a juíza de 1º grau afastou a justa causa aplicada ao trabalhador, condenando a empregadora a pagar-lhe as verbas rescisórias típicas da dispensa imotivada. ( nº 00930-2009-094-03-00-4 )

 

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