Covid-19 mascara os dados do desemprego e esconde a crise do mercado de trabalho

O avanço da covid-19 no Brasil já provocou um efeito devastador no mercado de trabalho. Os dados do IBGE apontam que o desemprego saltou de 11,2% no trimestre até janeiro para 12,6% em abril. Mas, segundo projeção do Itaú Unibanco, o número é, na verdade, bem pior.

As medidas de distanciamento social impostas para se tentar limitar o avanço da doença também têm reduzido o nível de procura por trabalho, fazendo com que o desemprego pareça menor do que é. 

Já com ajustes sazonais, a taxa de desocupação, pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, do IBGE, era de 12,1% no trimestre até abril. Segundo análise da equipe de macroeconomia do Itaú Unibanco, na verdade, o desemprego estaria em 16%, caso o volume de pessoas procurando trabalho tivesse se mantido no mesmo nível de antes do início da quarentena.

“Os dados mostram a destruição de emprego informal e formal, mas isso não significa elevação da taxa de desemprego”, lembra Luka Barbosa, economista do Itaú Unibanco. “Para que alguém seja considerado desempregado, precisa estar procurando colocação ou estar disponível para trabalhar. E o isolamento social prejudica dimensionar esse número.”

Com o isolamento, a taxa de participação caiu três pontos, de um patamar de 62% em fevereiro para 59% em abril. Isso quer dizer que menos pessoas puderam procurar trabalho. Além disso, o início do pagamento do auxílio emergencial de R$ 600, para trabalhadores desempregados e informais de baixa renda, reduziu a procura.

Segundo Barbosa, a pandemia acaba mascarando os números, já que muitos brasileiros que perderam o emprego e estariam procurando uma nova vaga desaparecem da conta. “Hoje, trabalhamos com um cenário em que o desemprego sobe e fecha o ano na casa dos 17%. À medida que a economia reabrir, em ritmos diferentes, a depender da situação em cada cidade, uma parte das pessoas volta a procurar emprego.”

O mecânico Valmir da Silva, de 51 anos, é uma dessas pessoas que, apesar de terem perdido o emprego, estão fora do cálculo. “Não dá para procurar outro emprego agora. É sair de casa, correr o risco de ficar doente e voltar sem nada”, diz.  A reportagem conversou com o mecânico na fila de uma agência da Caixa, onde estava havia 12 horas à espera de informações sobre o auxílio emergencial.

Baque

Um levantamento com mais de 2,5 mil empresas, de pesquisadores do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV), aponta que os efeitos da pandemia foram mais ferozes no setor de serviços e na construção civil. Quase metade das empresas desses segmentos ouvidas precisou demitir por conta dos efeitos da covid-19. “Opções que foram dadas pelo governo, como a suspensão de contratos e a redução de salários em até 70%, não são suficientes”, avalia Viviane Seda, coordenadora das Sondagens do Ibre. 

Ela ressalta que a perda de renda dos trabalhadores acaba tendo um efeito maior sobre o corte de vagas em setores não essenciais. “Nas atividades imobiliárias, no turismo e lazer, a recuperação será mais lenta.”

Os dados do primeiro trimestre do Produto Interno Bruto (PIB), divulgados recentemente pelo IBGE, ajudam a traçar um cenário difícil para os próximos meses: por conta dos efeitos da pandemia, o consumo das famílias caiu mais de 2% e puxou o resultado do PIB do País para baixo (-1,5%).

Nesse cenário, a intenção de contratação para o terceiro trimestre caiu 29 pontos porcentuais em comparação com o trimestre anterior, segundo pesquisa do ManpowerGroup. Assim, 21% das empresas ouvidas afirmam que irão reduzir o quadro de funcionários.

“O Brasil vinha demonstrando sinais de uma tímida recuperação em termos de empregabilidade, que acabou sendo freada pela pandemia. Temos percebido, no entanto, forte demanda por contratações entre os setores essenciais, como alimentação, farmacêutico, logística e saúde” diz Nilson Pereira, do ManpowerGroup Brasil.

 

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