Chamar a atenção de empregados em público, causando a eles constrangimento, pode ser caracterizado na Justiça como assédio moral. Assim como usar apelidos ofensivos, como "macaco", "pinguço", "vaca", entre outros termos depreciativos que beiram o insulto. Várias ações que chegam à Justiça do Trabalho de Minas têm denunciado esse tipo de tratamento abusivo e, em suas decisões, os magistrados vêm chamando a atenção para o respeito recíproco que deve reger o contrato de trabalho e as relações entre empregado e empregador.
Recentemente, a juíza da Vara do Trabalho de São Sebastião do Paraíso, Clarice Santos Castro, julgou um caso de assédio moral, no qual o tratamento dispensado aos empregados pelo gerente foi considerado abusivo, tornando o ambiente de trabalho hostil. Na análise dos elementos do processo, a juíza considerou a dificuldade de se produzirem provas em ações dessa natureza e ponderou: "Nesses casos, não se pode aplicar rigor excessivo, sob pena de total inviabilização da tutela jurídica nesses assuntos, uma vez que o rastro rarefeito é próprio dessas condutas robustas, cujo sucesso depende da clandestinidade e do temor referencial" .
Citando doutrina, ela lembra que, para a caracterização do dano moral, considerado como lesão na esfera da dignidade humana, em seus diversos aspectos, é preciso que haja uma conduta violadora da personalidade, isto é, lesiva ao direito subjetivo da vítima, como a honra e a imagem ou qualquer outro aspecto da sua condição humana. Assim, como se trata de lesão de ordem imaterial, subjetiva, não se pode exigir os mesmos meios de prova utilizados para a comprovação do dano material. Afinal, como comprovar a dor, a tristeza ou a humilhação através de depoimentos, documentos ou perícia?
No caso, embora a primeira testemunha levada pela empregada que denunciou a conduta abusiva do gerente tenha afirmado desconhecer qualquer ofensa dirigida a ela, acabou confirmando, por meios indiretos, o ambiente hostil, ao reafirmar o tratamento desrespeitoso contra todos os empregados, por parte do gerente, que usava termos ofensivos e chamava a atenção dos subordinados em público. Já a segunda testemunha disse ter visto o gerente chamando a reclamante de "vaca" na frente de todos os colegas.
A juíza alerta que, nos termos do artigo 932 do Código Civil, o empregador responde pelos atos praticados por seus empregados, no exercício do trabalho, independentemente de culpa. Principalmente, se a esse empregado for dado poder diretivo, como no caso. "A relação laboral enfeixa dois princípios angulares da República: dignidade da pessoa humana e valor social do trabalho. Nesse compasso, é sempre pela lente desses ditames que a relação deve se estribar, de modo que o trabalho humano não consubstancia apenas fator agregado à atividade produtiva, mas fator de socialização, pois o trabalho tem posição de ascendência em cotejo com o capital. E, sob essa perspectiva humanística, é inadmissível qualquer investida empresarial tendente a desequilibrar essa dinâmica" , pontua.
Ela considerou que a empregada conseguiu provar que a conduta do gerente, patrocinada pela reclamada, não se resumia a um tratamento rude, mas, transformava a sua rotina de trabalho em algo opressivo e humilhante. Portanto, ficou evidenciado o abuso por parte da ré e, consequentemente, a conduta ilícita. Assim sendo, conforme ponderou a magistrada, a prova do dano não é fundamental, por situar-se este na esfera íntima da vítima, até porque, a potencialidade ofensiva do ato praticado é indiscutível: "No caso em vertente, é induvidosa a carga dilacerante que carregam as ofensas dirigidas à obreira, ensejadoras de dor e humilhação, em outros dizeres, abalo à dignidade. Não se pode descuidar de que a ação agressiva continuada cria para qualquer trabalhador um ambiente hostil, que lhe sangra a auto-estima em gotas" , finaliza a magistrada, fixando em R$5.000,00 a indenização por danos morais a ser paga à autora. A sentença foi mantida pelo TRT, que apenas reduziu o valor da indenização para R$3.000,00. (RO nº 01595-2009-151-03-00-1)
FONTE: TRT-MG