Daqui a 26 anos, em 2040, metade da força de trabalho brasileira vai ter de 50 anos para cima. É nessa faixa etária que atualmente uma parcela da população masculina tem ficado sem proteção social. São chamados os “nem nem maduros”: são pessoas que não trabalham, nem procuram emprego, nem estão aposentados.
É numa referência aos “nem nem jovens”, como ficou conhecida a geração que não estuda, nem procura emprego, nem trabalha. Estudo inédito do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), das pesquisadoras Ana Amélia Camarano e Danielle Fernandes, mostrou que eles eram 330 mil homens de 50 a 69 anos em 1992. Em 2012 já eram 1,3 milhão. Nesse par de décadas, saltaram de 4,2% para 7,9% dessa faixa de idade.
— Esses homens estão em famílias com baixa escolaridade, são mais pobres. Sobrevivem em parte com a renda do cônjuge que trabalha ou recebe benefício. Eles têm mais dificuldade para acompanhar as mudanças tecnológicas. É preciso investir em qualificação nesse grupo — diz Ana Amélia.
O levantamento está saindo publicado no Boletim de Mercado de Trabalho do Ipea, usando dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do IBGE, até 2012.
O pernambucano Jair Ferreira de Araújo, de 50 anos, começou a trabalhar cedo mas não sabe se já tem tempo de contribuição para se aposentar. Ele perdeu a primeira carteira profissional. Trabalhou implantando cabeamento (de telecomunicações) e na construção. Seu último emprego foi em 2013. Já consumiu todo o FGTS e o dinheiro da indenização. A situação só não é pior porque mora na casa do pai, o ex-cobrador de ônibus Wilson Ferreira de Araújo, de 76 anos, que é aposentado. Entre filhos e netos, sete pessoas moram na casa de Wilson.
— Trabalhava de domingo a domingo, muitas vezes sem receber hora extra. Mas tinha serviço, salário no fim do mês, não reclamava. Nunca fui no INSS ver se tenho direito à aposentadoria — diz Jair.
MULHERES SÃO CHEFES DOS DOMICÍLIOS
Na mesma condição de Jair estão 9,1% dos nem nem maduros. Eram 5,3% em 1992.
— Um quase idoso que é sustentado por um idoso — comenta Ana Amélia.
No lar de 13,1% dos nem nem maduros, a responsável financeira pela casa é a mulher. Em 1992 eram apenas 1,1%. A entrada da mulher no mercado de trabalho nas últimas décadas ajuda a explicar o crescimento desse contingente de inativos na população masculina.
É o caso do também pernambucano Geraldino Antônio Ribas, 61 anos, de Carpina — distante 56 quilômetros do Recife — que se mudou para a capital do estado aos 20 anos, em busca de estudo e emprego. Deixou o último trabalho em 2009 e desde então não conseguiu mais emprego, nem a aposentadoria.
Como ainda faltavam dois anos e meio para completar o tempo para se aposentar, pagou o que devia com o dinheiro da indenização e requereu o benefício. O pedido foi indeferido, mas ele recorreu.
— Hoje não é tão fácil arranjar emprego na minha idade — afirma Ribas.
Quem está garantindo o sustento da família é a mulher, Edileuza Rivas, secretária no Colégio Marista, que fica próximo à casa da família:
— Por enquanto está dando para levar. Ainda moram conosco a minha sogra e um cunhado, ambos dependendo do nosso trabalho.
FAMÍLIAS COM RENDA MENOR
As famílias dos nem nem maduros são mais pobres. Em média, o rendimento domiciliar per capita é de R$ 697,20, o que equivale a 61% da renda dos lares onde não há homens com esse perfil. Só um terço deles tem renda vinda de aluguéis e de aplicações.
O estudo das pesquisadoras sugere mudança nas relações de gênero, já que as mulheres passaram a assumir a posição de referência da família. Ao contrário dos homens, a parcela das mulheres nem nem de 50 a 69 anos vem caindo. Eram 40,3% em 1992; em 2012, 28,1%.
A economista Hildete Pereira de Melo cita um componente social para essa situação:
— Às vezes não se dá certo na vida. São os insucessos. A mulher sustenta, fica presa pela paixão.
A própria Hildete é responsável pelo irmão mais novo, de 66 anos. Fracassos amorosos, profissionais e a doença tiraram Pedro do mercado de trabalho:
— Ele foi morar com meus pais. Prometi no leito de morte da minha mãe que cuidaria dele.
No Brasil, apesar do envelhecimento rápido da população, os trabalhadores estão se aposentando mais cedo: em 1980, a idade média era de 61 anos, hoje está em 59,7 anos.