O Supremo Tribunal Federal (STF) declarou que o Congresso Nacional foi omisso ao não regulamentar o artigo da Constituição que determina o pagamento de aviso prévio ao funcionário demitido sem justa causa em valor proporcional ao tempo trabalhado na empresa. Por isso, os ministros da Corte decidiram que eles mesmos vão criar as regras.
A discussão foi suspensa para a definição de uma fórmula para calcular a indenização.
Ao fim do julgamento, que ainda não tem previsão para ser retomado, o trabalhador há muitos anos em uma empresa poderá receber o equivalente a mais de um mês de salário a título de aviso prévio. Até a decisão final do STF, o Congresso terá a chance de por em votação um dos mais de 40 projetos que tramitam sobre o tema.
A decisão foi tomada no julgamento de uma ação de quatro funcionários da Vale, um deles demitido após 30 anos de serviço. Eles pediram que o STF, na falta de uma lei específica, obrigasse a empresa a pagar aviso prévio proporcional ao tempo trabalhado na empresa. O direito está previsto na Constituição, mas desde 1988 o Congresso não aprovou lei criando uma fórmula de cálculo.
No julgamento, os oito ministros presentes concordaram com os trabalhadores, mas não chegaram a um consenso sobre como calcular a indenização. Marco Aurélio Mello propôs que quem trabalhasse em uma empresa por três anos recebesse apenas como aviso prévio apenas o piso previsto na Constituição, o equivalente a 30 dias de trabalho. A partir do quarto ano, o trabalhador receberia dez dias a mais por ano. Ou seja, quem trabalhasse quatro anos, receberia aviso prévio de 40 dias. Por essa fórmula, o trabalhador da Vale receberia como aviso prévio o equivalente a 300 dias de salário – dez vezes mais do que de fato recebeu quando foi demitido.
Para o ministro Ricardo Lewandowski, o modelo ideal seria o argentino, no qual pagam-se 30 dias corridos para trabalhadores contratados a menos de um ano, 45 dias para os contratados há mais de um ano e menos de 10 anos, e 60 dias para contratados há mais de uma década. O ministro Luiz Fux sugeriu o modelo suíço, que prevê três meses de aviso prévio quando se atinge dez anos de empresa ou mais.
– Ao decidir sobre o caso concreto, produzimos uma norma que será observada. Já temos consenso básico quanto a necessidade de decisão em caso concreto. Eu indicaria adiamento para que tentemos produzir uma forma de consenso – sugeriu o relator, ministro Gilmar Mendes.
O presidente do STF, ministro Cezar Peluso, chegou a sugerir o pagamento de cinco dias de aviso prévio por ano trabalhado, além dos 30 dias estabelecidos na Constituição. Peluso concordou com o adiamento e sugeriu que os ministros consultem projetos de lei e exemplos de outros países para pensar na fórmula ideal para o Brasil.
A decisão do STF, quando for fixada, só poderá ser aplicada aos casos em discussão. Outros trabalhadores interessados em obter o mesmo direito terão de entrar com ações na Justiça. A regra que a Corte criar só valerá até que o Congresso aprove lei específica. Segundo o ministro Carlos Ayres Britto, existem no Congresso 49 propostas em tramitação sobre aviso prévio. Para ele, não cabe ao STF legislar. Por isso, uma decisão não poderia ter validade ampla.
– Se ultrapassarmos o caso concreto, termina sendo legiferação. Podemos falar da inércia do legislador, mas apenas para o caso concreto. O que o mandado de injunção (o tipo de ação julgada ontem) nos autoriza é decidir o caso concreto na ausência de lei – afirmou.
O STF já ousou criar normas em outras ocasiões, diante da omissão do Congresso. O caso mais famoso ocorreu em 2007, quando o tribunal decidiu que, em caso de paralisação no serviço público, os servidores seriam submetidos às mesmas regras que definem o direito de greve em empresas privadas. A decisão tem validade até que o Congresso regulamente o direito de greve dos servidores – o que até hoje não aconteceu.
Procurado pelo GLOBO por meio de sua assessoria de imprensa, o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, não quis se manifestar sobre a decisão do STF. O Ministério Público do Trabalho também não quis comentar o assunto. Fonte: Carolina Brígido.