Os ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) acolheram recurso de um espólio para excluir da herança uma mulher que manteve relacionamento amoroso com o falecido ao longo de 17 anos, por concluir não ter sido comprovado que ela não soubesse que ele era casado durante todo esse período.
Segundo o relator do caso, ministro Luis Felipe Salomão, ‘não é crível que, após 17 anos de relacionamento, a autora da ação não soubesse que o falecido, além de casado, mantinha convívio com sua esposa, de quem não se achava separado de fato’.
As informações foram divulgadas pelo STJ – o número deste processo não é divulgado por causa do segredo judicial.
Para o ministro, o ponto central da controvérsia está em definir se ocorreu concubinato de boa-fé – situação em que a mulher não saberia da real situação do parceiro.
“O deslinde da controvérsia posta nos autos, portanto, reclama tão somente a correta qualificação jurídica da convivência afetiva ostensiva, contínua e duradoura estabelecida com pessoa casada que não se encontrava separada de fato: concubinato ou união estável”, destacou o ministro.
O tribunal de origem manteve a sentença que julgou procedente a pretensão da mulher, considerando demonstrada a união estável putativa e determinando a partilha de 50% dos bens adquiridos durante a convivência, ressalvada a meação da viúva.
Porém, no STJ, em voto acompanhado de forma unânime pelo colegiado, o ministro Salomão afirmou que a mulher não conseguiu comprovar a ocorrência do concubinato de boa-fé, o qual, segundo doutrina, ‘poderia ensejar a aplicação analógica da norma do casamento putativo’.
Revaloração de fatos
Salomão observou que ‘toda a moldura fática que vincula o deslinde da controvérsia está transcrita no acórdão recorrido, inclusive com a reprodução de depoimentos e testemunhos, o que possibilita a sua revaloração pelo STJ a fim de lhe atribuir qualificação jurídica diversa, sem a necessidade do revolvimento do acervo probatório vedado pela Súmula 7‘.
Entre os fatos narrados no acórdão, o ministro citou que ambos trabalhavam na mesma repartição pública, e a mulher teria ouvido que ele era casado.
“Analisando o quadro fático perfeitamente delineado pelo tribunal de origem, considero que não se revela possível extrair a premissa de que a autora mantinha relação amorosa contínua e duradoura com o de cujus sem ter ciência de que ele era casado e não se achava separado de fato da esposa”, disse.
Exclusividade
Salomão sustentou que o sistema criado pelo legislador pressupõe a exclusividade de relacionamento sólido para a caracterização da união estável.
“Poder-se-ia dizer que o maior óbice ao reconhecimento de uma união estável entre pessoas sem qualquer parentesco seria a existência de casamento”, resumiu o ministro.
Ele citou precedentes do STJ que, por força do disposto no parágrafo 1º do artigo 1.723 do Código Civil, afirmam a impossibilidade de se reconhecer união estável de pessoa casada não separada de fato, o que demonstra a vedação à atribuição de efeitos jurídicos às relações afetivas paralelas, como a que ocorreu no caso analisado.